Duas coisas estão na cabeça de nove entre dez gestores comerciais do mercado de açúcar nesse final de mês. Primeiramente, mais afeito aos traders, o volume de entrega física de açúcar contra o vencimento do contrato futuro de março que ocorre na próxima terça-feira, dia 28, em pleno Carnaval. Tem gente apostando em até um milhão de toneladas de Brasil, América Central e Argentina. Em segundo lugar, mais ao pessoal ligado ao campo, o sentimento de que apesar das chuvas de janeiro, a produtividade agrícola preocupa. Falaremos mais sobre isso.
No caso da entrega, há sempre um infindável argumento se as entregas físicas são sinal de robustez ou fraqueza do mercado. Acredito, sem ciência para me apoiar, que em vencimentos que coincidem com a plena safra do Centro-Sul, como é o caso do maio, julho e às vezes o outubro, quando um único recebedor entra em cena para abarcar uma quantidade volumosa de açúcar, é natural que o mercado perceba esse gesto como altista. Passa a ideia de que apesar de plena oferta do produto, ainda assim alguém se propõe a recebê-lo porque tem um enorme mercado consumidor para suprir. Mas, quando um volume considerável (vamos dizer 600-800 mil toneladas, pois acho um milhão exagerado) é entregue contra o vencimento março, que em tese representa a entressafra do Centro-Sul, o mercado pode perceber isso como fraqueza do físico.
Se alguém vende açúcar para entrega contra a expiração do contrato futuro de março, sabe que o comprador pode apresentar o navio até a primeira quinzena de maio e pode tê-lo feito por alguma das seguintes razões: a) não conseguiu preço melhor para entrega imediata do açúcar que possui e aposta que o custo financeiro e de armazenagem para carregar o açúcar até que o comprador apresente o navio é menor do que o desconto no mercado à vista; b) o vendedor não possui/produziu o açúcar e assume que o comprador vai apresentar o navio em data próxima ao início de sua moagem para a 2017/2018. Podem haver outras razões, mas as duas citadas, se por acaso ilustram o momento atual, escancaram um mercado físico fraco.
O mercado futuro de NY fechou a sexta-feira com o março cotado a 19.80 centavos de dólar por libra-peso, uma queda de 50 pontos em relação à semana anterior. Foi uma queda de R$ 25-30 por tonelada. Todos os vencimentos correspondentes à safra 2017/2018 fecharam com desvalorização média de 45 pontos, ou cerca de 10 dólares por tonelada. O spread H/K que mostra a percepção do trader do comportamento do físico e chegou a negociar com prêmio de 128 pontos, praticamente zerou agora no final. Ou seja, enquanto antes tinha-se a preocupação de que faltaria açúcar um par de meses antes do início da safra, agora a preocupação é zero.
Permita-me, caro leitor, repetir aqui o terceiro parágrafo do comentário semanal da semana passada. Faço-o pela relevância (depois explico): “o mercado vai precisar de uma renovação dos fundamentos para que consiga permanecer acima dos 20 centavos de dólar por libra-peso. A média de 50 dias dos fechamentos está em 19.94 centavos de dólar por libra-peso. A última vez que o mercado quebrou a média de 50 dias, no final de outubro, dez dias após assistimos a uma desvalorização de 150 pontos, chegando a 200 em 20 pregões”. A média de 50 dias foi quebrada com o fechamento de sexta. Como reagirá o mercado na semana que vem?
Quer um fator altista, que pode ser forte e mudar a trajetória de preços? Em uma conversa com o pessoal da Sigma, empresa especializada em geoprocessamento, ou seja, produzem uma análise criteriosa por meio de satélites do canavial, acredita que o Centro-Sul hoje possui uma área de cana de 7.6 milhões de hectares e que a produtividade agrícola média esperada é de 75 toneladas de cana por hectare (temos uma idade média do canavial bem alta). Fazendo a conta, temos uma safra de cana de 570 milhões de toneladas. Nos parâmetros atuais, isso é uma redução de um milhão de toneladas de açúcar.
Dissemos que esse ano ia ser de volatilidade e a profecia está se confirmando. Segure-se bem que vem mais solavancos por aí.