Uma questão de arbitragem – Por Arnaldo Luiz Corrêa

Uma questão de arbitragem – Por Arnaldo Luiz Corrêa

O mercado internacional de açúcar teve uma semana de ligeira recuperação. O vencimento março/2015 chegou a bater pouco mais de 15 centavos de dólar por libra-peso, uma melhora de 11 dólares por tonelada comparando com o fechamento da sexta-feira anterior. No entanto, negócios e humores continuam em baixa. A próxima semana será ainda mais desanimadora em função do Carnaval no Brasil e o feriado dos EUA. Os baixistas estão de tal maneira agarrados às suas convicções de que o mercado continuará em queda, que 2/3 dos leitores ao responderem à nossa pesquisa da semana passada, sobre onde colocariam numa aposta direcional obrigatória de US$ 1 milhão, se 12 centavos de dólar por libra-peso ou 18 centavos de dólar por libra-peso. 2/3 dos leitores acreditam em mercado a 12 centavos de dólar por libra-peso!
No final de 2014, com o contrato de açúcar em NY fechando a 14.61 centavos de dólar por libra-peso e o dólar valendo 2.6546 reais, o valor da tonelada de açúcar FOB era de 890 reais. Com o fechamento dessa sexta-feira, o valor da tonelada subiu para R$ 971, um ágio de 9%, acima da desvalorização cambial que foi de 6.5%. Um trader do mercado disse que mesmo com a desvalorização da moeda, o açúcar precisou recuperar competitividade vis-à-vis a apreciação do etanol. “Uma questão de arbitragem”, disse o trader.
A Agência Nacional do Petróleo divulgou o total de vendas de combustíveis em 2014. O país consumiu 57.4 bilhões de litros um acréscimo de 7,85% em relação ao mesmo período do ano passado. Em valores absolutos, o consumo cresceu no ano passado 4,175 bilhões de litros, dos quais 1,594 bilhão de gasolina A (antes da mistura) e 2,581 bilhões de etanol (anidro e hidratado). O número é surpreendente haja vista a situação econômica. Esse é o ponto que eu gostaria de alertar aqui. Mesmo com uma recessão este ano, estimada por conceituados economistas ao redor de 1.5% de queda do PIB, ainda assim o ritmo de vendas de veículos leves continuará. Em menor escala, mas a frota continuará aumentando. No último comentário falamos que o crescimento do consumo de etanol para este ano seria de 4.3 bilhões de litros. Pelo número consolidado da ANP em 2014 vemos que essa estimativa é absolutamente factível. Explico: o consumo deve aumentar quando mudarmos o percentual de mistura para 27% dos atuais 25% e o estado de MG, segundo maior consumidor, deve aumentar o consumo de etanol em função da redução do imposto naquele estado, trazendo maior competitividade para o etanol. Traduzindo esse consumo para tonelagem de cana chegamos grosso modo a 50 milhões de toneladas necessárias a mais para a safra 2015/2016.
A 1ª. Estimativa da Archer para a safra 2015/2016 no Centro-Sul é de 573.7 milhões de toneladas com uma produção de açúcar de 32.2 milhões de toneladas e 26.3 bilhões de litros de etanol divididos em 10.9 bilhões de litros de anidro e 15.4 bilhões de litros de hidratado. Numa simulação entre o mix de açúcar (de 43% a 45%) e o volume de moagem (entre 570 e 590 milhões de toneladas), a produção máxima de açúcar seria de 34.7 milhões de toneladas e a mínima, de 32 milhões de toneladas. Com esse acréscimo pífio, evidentemente que teremos volatilidade no açúcar. Sem cana suficiente para atender essa demanda adicional, o único jeito – se a arbitragem compensar – é produzir mais etanol e menos açúcar.
Enquanto o real se desvaloriza em relação ao dólar em 15% nos últimos doze meses, a moeda indiana foi em outra direção se valorizou 2% no mesmo período. Para receber os mesmos reais hoje que recebia há um ano, o produtor de açúcar pode vender seu produto com desconto de 15% em dólares. Já o produtor indiano para receber a mesma quantidade de rúpia que recebia há um ano, precisa vender seu produto com acréscimo de 2%, em dólares. Não há dúvida de quem sofre mais com a queda do mercado de açúcar. Não é sem razão que o assunto subsidio vem à tona naquele país. O valor estimado do subsidio é de US$ 11.20 por tonelada, aproximadamente 3-4% do valor do açúcar no mercado internacional. Curiosamente, o primeiro ministro Narendra Modi era contra qualquer subsidio em sua campanha.
No mundo da lua: um diretor do BNDES afirmou em entrevista ao jornal Valor Econômico que “as usinas vão ter em 2015 um dos melhores anos em muitos anos”. Ao mesmo tempo, as agências de rating, como a S&P e a Fitch, entendem que o ano será extremamente difícil para as usinas apesar da volta da CIDE. A estimativa da Archer é que a dívida do setor nessa semana está em R$ 76,7 bilhões de reais contra um faturamento estimado para 2015/2016 de R$ 73,5 bilhões.
Hermes da Fonseca, segundo vários historiadores, foi o mais medíocre dos presidentes brasileiros desde a proclamação da República, em 1889. Eleito de forma direta em 1910 após uma campanha incendiária, respaldado pelos militares numa aliança entre gaúchos e mineiros, enfrentou e venceu Rui Barbosa, que tinha o apoio de paulistas e baianos, por uma diferença de 400.000 votos (dizem que houve fraude). Sua eleição representava o retorno dos militares ao poder depois de quatro presidentes civis, para restaurar o que aqueles chamavam de “os ideais republicanos”. Hermes era candidato da oposição até a morte do então presidente Afonso Pena, que apoiava outro candidato. O vice Nilo Peçanha tomou posse e passou a apoiar a candidatura de Hermes. Seu governo enfrentou revoltas e greves já na manhã seguinte à posse, enfrentadas com pesada dose de repressão e arbitrariedade, enfraquecendo-o politicamente a ponto de, com dois anos no poder, ser considerado unanimemente “uma nulidade”. Levou pouco mais de cem anos para que Hermes fosse finalmente ultrapassado “com louvor” no quesito mediocridade, nulidade, arrogância e prepotência.


Arnaldo Luiz Corrêa é diretor da Archer Consulting - Assessoria em Mercados de Futuros, Opções e Derivativos Ltda.